Amazônia e Pará: reféns da miopia estratégica e da estagnação logística?

Por Fabio Maia

Enquanto o mundo avança a os largos na reconfiguração das rotas comerciais e na construção de infraestruturas logísticas monumentais, a Amazônia, e em especial o estado do Pará, parece patinar em um debate anacrônico, preso a discussões sobre a viabilidade de projetos básicos que nossos concorrentes econômicos já superaram há décadas. A análise fria dos dados globais, confrontada com a nossa paralisia interna, expõe uma realidade incômoda para nossa região: estamos sendo deixados para trás, não por falta de potencial – que temos de sobra –, mas por uma aparente combinação de miopia estratégica e submissão de nossos representantes políticos a interesses que não são os do povo amazônida e paraense.

Os números globais mostram a concentração da riqueza e do comércio no Hemisfério Norte. Para que a Amazônia, com sua posição geográfica privilegiada, possa se inserir de forma competitiva nessas rotas, a modernização e a expansão de nossa infraestrutura portuária e logística são vitais. No entanto, o que vemos em nossa própria casa, no Pará?

Vemos um estado que ainda debate a conclusão e pavimentação de rodovias essenciais como a BR-163 e a Transamazônica, e discute interminavelmente a viabilidade de ferrovias como a Ferrogrão, enquanto nossos concorrentes planejam e executam projetos intercontinentais com visão de décadas. Observamos a Europa interligando suas bacias hidrográficas em redes eficientes, enquanto nós, no coração da maior bacia hidrográfica do planeta, subutilizamos nossos rios Tapajós, Xingu, Tocantins e o próprio Amazonas, emperrados em discussões sobre dragagens, derrocamentos e licenciamentos ambientais que parecem infindáveis.

Assistimos à evolução global para mega-navios que exigem super-portos com calados superiores a 20 metros. Enquanto isso, nossos portos paraenses, como Vila do Conde, lutam para manter seus 14 metros, o Porto da Embraps que luta a mais de uma década pelo seu licenciamento, e projetos visionários como o Porto Offshore do Pará – com potencial para 20 metros de calado, localização estratégica ímpar e capacidade de revolucionar o escoamento da produção do Centro-Oeste e do próprio Pará para a Ásia a custos drasticamente menores – permanecem no campo das ideias, vítimas de uma paralisia decisória inexplicável sob a ótica do interesse regional e nacional.

Essa estagnação amazônica não é fruto do acaso. Ela parece ser o resultado direto de uma classe política regional e nacional que, em grande medida, abandonou a concepção de “projetos de estado” – aqueles que transcendem governos e visam o fortalecimento estratégico da Amazônia e do Brasil a longo prazo – para se concentrar em “projetos políticos” de curto prazo, focados em ciclos eleitorais e, muitas vezes, alinhados a interesses externos ou de outras regiões que lucram com a nossa ineficiência logística e dependência.

Quando nossos representantes – aqueles que elegemos para defender os interesses do Pará e da Amazônia – se curvam a pressões ambientais excessivas, a lobbies de outras regiões ou a interesses internacionais que preferem uma Amazônia intocada e economicamente irrelevante, eles condenam nossa região à estagnação. Permitem que o Pará continue a ser um mero exportador de commodities de baixo valor agregado (minério, grãos, gado em pé), transportadas a custos exorbitantes que corroem nossa competitividade, enquanto nossos concorrentes agregam valor, industrializam e dominam os mercados globais.

O mais perverso é que essa mentalidade de atraso e submissão parece ter se enraizado em nossa própria sociedade paraense e amazônida. O discurso do comodismo, da aceitação de que “aqui é assim mesmo”, da descrença na capacidade de realização de grandes projetos, torna-se perigosamente comum. Acostumamo-nos com a incompetência e a mesquinhez, aceitando como normal uma realidade artificial que nos é imposta por representantes despreparados, míopes ou comprometidos com agendas alheias aos anseios de nossa população.

Enquanto lutamos por infraestrutura básica – asfalto que resista às chuvas, portos que não congestionem na safra, energia confiável e a preços justos, internet de qualidade –, nossos concorrentes investem em tecnologia de ponta, automação e integração logística. Eles geram riqueza e empregos de qualidade, enquanto nós vemos nossos jovens partirem em busca de oportunidades que não encontram aqui, e continuamos a exportar nossos recursos naturais a baixo custo para importar produtos industrializados, perpetuando um ciclo vicioso de dependência.

Romper com essa estagnação exige uma mudança de mentalidade profunda, aqui mesmo, no Pará e na Amazônia. Precisamos resgatar nossa capacidade de sonhar grande, de planejar a longo prazo e de defender intransigentemente os interesses de nossa região. Projetos como o Porto Offshore do Pará, a Ferrogrão, a hidrovia do Tocantins-Araguaia e a integração logística multimodal da Amazônia não podem ser vistos como utopias distantes, mas como necessidades estratégicas urgentes para nosso desenvolvimento. É hora de cobrar de nossos representantes – prefeitos, deputados estaduais e federais, senadores, governadores – uma postura altiva, visionária e verdadeiramente comprometida com a construção de uma Amazônia e um Pará logisticamente eficientes, economicamente competitivos e onde nossa gente possa prosperar.

O Impacto

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